Servidora de Tribunal sofre violência racista





S. Paulo, 27/9/06  – Terça-feira, 19 de setembro, será um dia para nunca mais ser esquecido pela serventuária da justiça negra Edvanilde de Moura, 49 anos, mãe e avó de dois filhos e dois netos. Ela teve sua casa invadida, foi agredida e arrastada com uma “gravata” por policiais militares da 1ª Companhia do 9º Batalhão. Levada para a delegacia, permaneceu algemada por quase quatro horas, sendo submetida a todo tipo de constrangimento.

 

“Lixo. Preto é tudo igual e tem de apanhar para ficar quieto”, diziam os policiais envolvidos na sua prisão ilegal e violênta, entre os quais ela identificou o PM Carlos Kayo Kissi e a soldada Ana Lúcia da Cruz Santos, da Ronda Escolar.

 

Tudo começou por volta das 7h30 quando a serventuária pediu aos policiais que parassem de espancar Ricardo dos Santos, seu vizinho. Ricardo, que também é negro, fora abordado por estar com uma moto parada na rua Armando Coelho Silva, Parque Peruche. Os policiais, segundo Edvanilde, passaram a agredir o rapaz a socos e ponta-pés apenas porque o mesmo “pediu calma” quando foi abordado.

 

A serventuária entrou em casa, mas minutos depois sua porta foi arrombada, recebeu voz de prisão e foi arrastada. No 13º DP, as cenas de violência racista continuaram. O investigador de nome Elias passou a ofendê-la com palavras de baixo calão, chamando-a de “preta suja”. “Não encosta na parede, senão vai sujar…”, afirmava, enquanto ameaçava obrigá-la a pegar nos seus órgãos genitais. “Pega na minha p…” dizia. O delegado assistente plantonista Carlos Alberto Gomes assistiu a tudo, sem interceder.

 

O advogado Maurício Carlos Borges Pereira, chamado pela filha de Edvanilde, Keite, de 27 anos, disse nunca ter assistido cena igual. “Eu me senti mal, apesar de não ser negro. É como se eu tivesse visto pela primeira vez na vida, na prática, uma coisa que eu sempre escutei que existia, mas nunca tinha presenciado. Um constrangimento e uma violência difícil de descrever”, contou Borges Pereira a Afropress.

 

A violência só terminou por volta das 11h30, depois de Edvanilde permanecer por quase três horas no PS de Santana para onde foi levada por ter se sentido mal. Sua pressão chegou a 15 x 10, embora não tenha pressão alta. No Pronto Socorro permaneceu algemada durante todo o tempo.

 

Ao tomar conhecimento dos maus tratos, o juiz Ivo de Almeida, da 2ª Vara Criminal, em cujo cartório Edvanilde trabalha há 27 anos, se solidarizou com a funcionária, entrou em contato com o delegado titular do 13º DP e determinou que ela fosse ouvida.

 

A presidente da Comissão do Negro e Assuntos Anti-Discriminatórios da OAB, advogada Carmem Dora Ferreira, já acionou o presidente da OAB/SP, Luiz Flávio Borges D’Urso e está articulando uma audiência pública na Assembléia Legislativa, com o apoio do SOS Racismo, que deverá reunir entidades negras e organizações comprometidas com os direitos humanos para denunciar o caso e exigir providências das autoridades, com a severa punição dos policiais responsáveis pelas violências.

De |setembro 27th, 2006|Notícia|Comentários desativados em Servidora de Tribunal sofre violência racista