Nota Oficial: Em Apoio às Políticas Afirmativas para a População Negra

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, instada por entidades da sociedade civil engajadas na promoção da igualdade racial, vem manifestar-se acerca de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade em pauta no Supremo Tribunal Federal, com grande impacto para os Direitos Humanos: a ADIN 3330, contra o programa PROUNI, e a ADIN 3197, contra a lei de cotas nos concursos vestibulares das universidades estaduais do Rio de Janeiro.


 


Ambas as ADINs contrapõem-se a políticas públicas de valorização da população negra, vitimizada historicamente pela desigualdade social, expressa hoje nos indicadores de elevada disparidade social, econômica e educacional da população negra comparada à população não-negra. As ações chegam ao STF após 120 anos de abolição da escravatura, que não incluiu reparações material aos indivíduos escravizados e seus descendentes, tendo sido vedada a distribuição de terras. Esse racismo estrutural reforçou os mais variados preconceitos e práticas discriminatórias, impondo sofrimentos que perduram até hoje.


 


As políticas públicas somente poderão coibir as desigualdades se focalizarem nas demandas específicas das populações afetadas pela discriminação. É preciso reconhecer as diferenças de tratamento para combatê-las. Não se pode ignorar que o critério racial foi criado socialmente, como não se pode negar a herança e os mecanismos sutis da preservação do racismo.


 


Políticas afirmativas como o PROUNI ou os sistemas de cotas nas universidades buscam identificar e selecionar as pessoas em função de sua cor/raça tão-somente com o objetivo de promover tais reparações. Logo, não geram privilégios, e sim promovem a equiparação.


 


Medidas para melhor a educação de base devem ser tomadas, é claro. Isso não se contrapõe à necessidade de ações imediatas para modificar a condição educacional da população negra. Tais medidas são indispensáveis tanto para garantir justiça social quanto para incentivar novas percepções dos espaços ocupados pelos negros e estimular uma revisão da lógica de distribuição do poder, para que, como defendia Martin Luther King Jr., as pessoas realmente sejam avaliadas pelo conteúdo de seu caráter, e não pela cor de sua pele.


 


É no atual contexto de reconhecimento das injustiças perpetradas contra a população afrodescendente ao longo de séculos que as políticas compensatórias, como o sistema de cotas para negros, foram adotadas pela iniciativa de instituições como a UnB, que com sucesso decuplicou o número de pessoas negras em seu corpo discente (de 2% para 20%).


 


Esta Comissão de Direitos Humanos e Minorias, no exercício de suas atribuições, mantém estreita colaboração com organizações da sociedade civil, movimentos sociais, agentes públicos e acadêmicos ligados aos Direitos Humanos. Por isso está em condição de testemunhar que, entre aqueles que se encontram, efetivamente, na luta diária pela afirmação dos Direitos Humanos, é generalizado o apoio e a compreensão da necessidade de políticas afirmativas para a população negra. Entretanto, o tema é projetado na mídia de forma invertida, pois privilegia a posição dos que a rejeitam. Os argumentos, amplificados pela mídia, são de caráter generalista. Em geral defendem a alternativa de uma estrutura de educação tão perfeita para todos que não foi possível ser concretizada até hoje. Ou se aferram a erros normais de execução cuidadosamente procurados e divulgados à exaustão.


 


As políticas afirmativas que nosso País está criando estão alinhadas com os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro junto à comunidade internacional, por meio de vários instrumentos dos quais somos signatários, como a Convenção Internacional pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a Convenção Internacional pela Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, a Convenção Internacional contra a Discriminação na Educação e a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho. Urge cumprir esses dispositivos legais e não negá-los com ações regressivas.


 


As compensações à população negra em curso são temporárias, durarão por um período determinado, enquanto não existirem condições próprias à equidade entre negros e não-negros no acesso à educação e ao trabalho de qualidade, ao reconhecimento efetivo da contribuição de negras e de negros, em todos os aspectos, para a construção deste país. É com a convicção de que as ações afirmativas como o PROUNI expressam os princípios constitucionais que aguardamos a manifestação dos Eminentes Ministros do Supremo Tribunal Federal.


 


Brasília, 07 de maio de 2008



 


Deputado Pompeo de Mattos


Presidente

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