Quilombo do Orobu: história, ousadia, resistência na periferia!
Na época (década de 90) as condições para um jovem negro adentrar nas universidades eram extremamente desfavoráveis. O custo de um cursinho pré-vestibular convencional e o gasto com alimentação e transporte determinava a frustração de sonhos e perspectivas. A escola com seu pensamento eurocêntrico descartava contribuição do povo negro (inclusive a própria história de resistência negra que ocorreu na região) e não conseguia dar respostas às aspirações da juventude negra da periferia. A busca pelo primeiro emprego, naquele contexto de aprofundamento da política neoliberal (privatizações, desemprego em massa), não passava de uma mera expectativa que ao invés da sua realização se transformava em desesperança e em diminuição da auto-estima. Acentuava-se o aumento da criminalidade entre a juventude por conta do tráfico de drogas. (observamos que esta realidade parece imutável visto que se passaram 10 anos e não tivemos mudanças estruturantes. .. O que indica que nossa ação é extremamente necessária e que precisamos ampliá-la)
Este também foi o momento em que algumas entidades do movimento negro denunciavam o preconceito racial no mundo do trabalho e se consolidava experiências de cursos alternativos de pré-vestibular com recorte racial a exemplo do Instituto Steve Biko.
Diante deste cenário, e inspirados nessas experiências aqueles jovens, em parceria com alguns adultos, resolveram criar um grupo de estudo para viabilizar o acesso da juventude local as universidades e ao mesmo tempo fortalecer um processo de organização popular comunitário, tendo em vista o fortalecimento da identidade étnico-racial e a luta pela efetivação da cidadania.
Ao comemorar 10 anos de caminhada observamos o quanto esta iniciativa tem contribuído para a concretude desses dois objetivos citados… Diante de mais de 700 jovens de ambos os sexos que passaram pela experiência desse quilombo educacional:
· Comemoramos a significativa contribuição ao processo de afirmação étnico-racial da juventude, a elevação da auto-estima e o aumento da consciência crítica fruto do processo de formação política (CCN – Cidadania e Consciência Negra, seminários, intercâmbios culturais etc.);
· Comemoramos o ingresso de cerca de 80 jovens nas diversas universidades;
· Comemoramos o exercício de um modelo de organização baseado no protagonismo juvenil;
· Comemoramos a consolidação de um modelo de organização popular baseado na auto-sustentaçã o financeira e no gerenciamento compartilhado através do conselho deliberativo que contempla a participação de alunos/as, professores/ as, ex alunos/as egressos das universidades e militantes da comunidade;
· Comemoramos a criação de um banco de professores especializados em solidariedade e comprometidos com a transformação da realidade imposta;
· Comemoramos nosso esforço coletivo no sentido de romper o silêncio e sair às ruas denunciando o extermínio da juventude negra;
· Comemoramos nossa luta, em conjunto com outras entidades do movimento negro, pela aprovação das cotas raciais nas universidades (nos sentimos protagonistas neste processo);
· Comemoramos nossa determinação em ampliar o serviço junto à comunidade, por isso é que lutamos pela construção do nosso espaço-terreiro;
Portanto, ao celebrar os dez anos, constatamos que devemos consolidar a tecnologia social que desenvolvemos através do curso pré-vestibular popular. Esta tecnologia tem que ser estendida aos outros programas da Associação. Precisamos intensificar o processo de formação política e ampliar nossos horizontes envolvendo a comunidade. Precisamos urgentemente nos aproximar daqueles jovens que não conseguimos atrair pela via do curso pré-vestibular, pois esses são os principais alvos dos grupos de extermínios. Precisamos construir nosso Centro de Referência da Juventude Negra para colocar em prática outros programas que tanto sonhamos (oficina criativa, biblioteca comunitária, centro de formação e inclusão digital, radio comunitária etc.). Para isso, precisaremos do empenho de todos e todas, e certamente não faltará daqueles e daquelas que garantiram a realização desses dez anos de resistência negra e ousadia.