21 ANOS DA PALMARES
Tempo de Cidadania e Diversidade!

Zulu Araújo
Presidente da Fundação Cultural Palmares / Ministério da Cultura

Há 21 anos, o Estado brasileiro deu um passo importante para o reconhecimento e o respeito à sua diversidade cultural. No dia 22 de agosto de 1988, criou a Fundação Cultural Palmares. Em verdade, a Palmares é fruto de dois movimentos convergentes de um momento histórico, expressos pelos movimentos negros em suas variadas matizes, e pelo novo ordenamento político e jurídico do país, materializado na Constituinte de 1988. Podemos dizer que a criação da  Fundação Palmares  contribuiu para que o exercício da cidadania e a promoção da igualdade no Brasil subissem mais um degrau.

Nessa trajetória, a liderança que a Fundação exerceu no campo institucional é incontestável. Esteve presente nos vários espaços onde a questão racial se desenrolava. Na luta pela aprovação do Estatuto da Igualdade Racial e na defesa dos quilombolas. Na valorização, preservação e difusão das manifestações culturais afro-brasileiras e na campanha pela cotas na Universidade e no registro da capoeira como Patrimônio Cultural Brasileiro. Enfim, muitos debates, reflexões, troca de experiências, erros, acertos (muitos acertos) e tudo que uma caminhada de 21 anos pode proporcionar. Mas nada disso nos tira o direito de afirmar que valeu e continua valendo a pena, como dizia o grande poeta português, “desde que a alma não seja pequena”.

Nesses 21 anos, a Palmares potencializou talentos, proporcionou o intercâmbio cultural interno e externo, notadamente com o continente africano, certificou e acolheu mais de 1.300 comunidades remanescentes de quilombos, participando de mais de 200 ações judiciais em sua defesa. Mapeou terreiros de candomblés, criou o Parque Memorial Quilombo dos Palmares, esteve presente nos principais fóruns internacionais, a exemplo da Conferência Mundial de Combate ao Racismo e à Intolerância, em Durban/África do Sul, em 2001, e a Conferência dos Intelectuais da África e da Diáspora, na Bahia/Brasil, em 2006.

Na gestão atual, avançamos um pouco mais. Reestruturamos o quadro administrativo da Palmares, criamos cinco novas representações regionais para dar agilidade a nossas ações e inauguramos uma nova sede, digna e confortável. Tudo isso para cumprir com os compromissos assumidos pelo atual governo com a promoção da cidadania e da diversidade.

No campo internacional, criamos o Observatório Afro-Latino, ferramenta indispensável para a um só tempo dialogarmos com os países vizinhos, trocarmos experiências e implementarmos políticas públicas de cultura para os afrodescendentes da América. Internamente, democratizamos a seleção de projetos por meio de editais, ampliamos o intercâmbio com a África, tanto na CPLP, como na promoção de eventos internacionais no Brasil, a exemplo do lançamento do III Festival Mundial de Artes Negras.

Portanto, comemorar esses 21 anos não deve servir apenas para fazer um balanço do que fizemos no passado, mas, sobretudo para pensar e organizar os passos futuros. Porém, precisamos, ainda, reposicionar nossos movimentos e ações. Parcela importante da sociedade brasileira vem se descolando paulatinamente da nossa agenda, em parte pela campanha incessante promovida pelos meios de comunicação contra as políticas de ações afirmativas, e, em especial, contra as cotas para o ensino superior, que refletem, obviamente, os interesses daqueles que foram largamente beneficiados pelos privilégios em nosso país, por séculos. 

Por isso mesmo, a Fundação Palmares está buscando ampliar suas parcerias, democratizar e dar transparência a suas ações tanto no campo institucional quanto no social. Estamos trabalhando para que nossas conquistas no campo cultural transformem-se em políticas de Estado, a exemplo da criação do Centro Nacional de Informação e Referência Negra, até porque se desejamos políticas públicas corretas para a cultura negra, o primeiro passo é conhecê-las, dialogar com seus criadores e difundi-las.

Passos como esses não podem ser dados solitariamente. Precisam estar articulados com os demais setores institucionais e os mais variados segmentos da sociedade, particularmente no campo da cultura. Nesse sentido, respeitar a diversidade e exercitar a cidadania é fundamental. 

Axé !

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Artigo publicado originalmente Jornal A Tarde, 19/08/2009